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O Último Godot, de Matéi Visniec (É Realizações Editora)


Inadvertidamente acertei na mosca ao pegar este livrinho para reiniciar minhas leituras do romeno Visniec, que está sendo editado integralmente no Brasil. Recebi este e mais 5 livros do Visniec da editora.
A peça é curta e vem acompanhada de um texto explicativo e de trechos relevantes de duas entrevistas com o autor. No total, apenas 36 páginas. Mas acreditem em mim, vale a pena.
A peça foi a última de Visniec, ainda bem jovem, antes de sair da Romênia para estabelecer-se em Paris. Nela, ele dá, como ele mesmo diz, uma espécie de adeus a Beckett enquanto influência, que desde sua adolescência acompanhou o futuro dramaturgo.
A sacada é ótima. Godot, em pessoa, encontra Beckett e, lamentando a morte do teatro, pede-lhe uma existência. Beckett aquiesce e ao final tudo se torna o que sempre foi, uma peça. O público aparece.
Chorei várias vezes ao ler esta pequena jóia. Nunca imaginaria como solucionar esse impasse, de Godot não existir e existir (uma puta sacada do irlandês), e de dar um desenlace, em nós, à figura avassaladora de Beckett. A peça é singela, bem-humorada e de ótimo gosto.
Mandei email à editora perguntando como faria para encená-la. Ficaram de me responder. Irei contatar um amigo: quero que ele faça Beckett e eu, Godot - o qual tem tudo a ver comigo, TUDO.

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