A montagem da Cia. Provisório Definitivo, com direção do Nélson, prometia algo de chocante. Relatos de guerra de crianças e jovens de todas as partes do mundo não prometem nada muito leve. Eu mesmo tenho os dois livros em que a peça se baseia, Diários de Guerra - Vozes Roubadas, de Zlata Filipovic e Melanie Challenger, e o Diário de Anne Frank. Mas apenas comecei o primeiro, e o segundo descansa intacto (não sei porquê).
Eu mesmo tenho em mim um pouco de uma criança desse tipo, pois vi o golpe do Chile, em 1973 (tinha seis anos), e as pegadas em minha alma eu as avalio até hoje. Por isso fui com certa aflição, preparado para uma peça forte sem ter muito pára-quedas em que pudesse me fiar.
A encenação trabalha com o excesso de escuridão e luzes focadas, pontuais. Mas esse é só um dos recursos utilizados. Os relatos são sempre em primeira pessoa. As atrizes e os atores se revezam, caso a caso, e muitos relatos são esmiuçados naquilo que - aparentemente - conseguem passar de dramático.
Eu já estava preparado para mais uma peça do Nélson com seu visual já claramente identificado - que deriva, em última instância, da extremamente bem-sucedida Luis Antônio - Gabriela. Não foi choque nenhum ver manequins de papel machê em tamanhos naturais e olhos e bocas rasgados. Não foi choque algum ver o elenco com maquiagem estranha, pálida, como se todos fossem nenhum. Não causou estranheza suficiente para impactar.
Tudo transcorreu como se fosse num jogo de video-game. Os nomes das crianças ao fundo e numa tela à frente, assim como textos retirados dos relatos, sempre com a face do choque presumido.
Mas não fiquei comovido. Algo aconteceu. Eu me identifiquei, legal, com vários dos atores e atrizes, vi muita coisa que me agradou - não aconteceu o mesmo com outros, mas infelizmente não me chocou - o que talvez fosse o que eu estivesse mesmo esperando.
Explico algo mais: leio jornais e livros, em determinados casos, a passo de tartaruga para, de forma consciente, captar aqueles detalhes que chocam o espírito de um sujeito que endureceu - eu. Por exemplo, nesses atentados em Boston perdi minutos seguidos identificando sangue, restos e expressões do momento. Caracterizando o que via, vendo o que me comovia. É assim também que leio relatos como esses em que a peça se baseou. Por isso digo: não me atingiu.
Chega a ser um divertimento. Mais julgamento eu me recuso a fazer. Pois preciso aprender.
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