Pular para o conteúdo principal

breu (áreas coletivo de arte) - 2a vez

não assisto duas vezes peça que não me agrada. então digo que esta me agradou.


mas deram-me nos nervos os ofegares (nem sei se esta palavra realmente existe) das interpretações do começo ao fim do espetáculo. e também a relativa artificialidade das soluções encontradas, nos diálogos, para os embates. tipo (alguma coisa)? não. ou sim. (repetição)? não. ou sim. e aí o silêncio. não é esse um silêncio rico, pelo que vejo. pois não dá margem a ambiguidades ou a sentidos que inculcam novos diálogos onde eles não existem. como em outros autores, em beckett, por exemplo.

agora reparei na marcação dos movimentos. na relativa artificialidade das idas e vindas. sei lá, algo me pareceu óbvio demais, ou na verdade este espetáculo não deveria ser visto duas vezes ou mais, pois suas soluções perderiam a graça. talvez seja isso.

mas, apesar de tudo isso, ele continua agradando. as intromissões dos poemas, da carta de hannah arendt a heidegger, de o mar, simplesmente, criam novas camadas de compreensão nisso que poderia ser apenas um encontro, uma cena realista. o mesmo com a entrada da mensagem póstuma, como se num rádio ou gravação estragada. tudo isso coloca a cena num mundo que está de fora de tudo isso, ao que parece. pois sentimos o governo entrando, sentimos o irmão fugindo, sentimos medo do cachorro que já morreu (era o cachorro lá fora, não um homem), sentimos também o peso da necessária resistência.

mas ao final, como da primeira vez, tudo vira história. e é legal, isso. legal reparar o quanto pode ser retirado de leituras díspares da história, de uma ferida que não foi fechada (ainda), da vida e da morte.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Gargólios, de Gerald Thomas

Da primeira vez que assisti a Gargólios, do Gerald (Thomas), na estréia, achei que não havia entendido. Alguns problemas aconteceram durante o espetáculo (a jovem pendurada, sangrando, passou mal duas vezes, as legendas estavam fora de sincronia, etc.) e um clima estranho parecia haver tomado conta do elenco - ou pelo menos assim eu percebi. De resto, entrei mudo e saí calado. Mas eu já havia combinado assistir novamente o espetáculo, com a Franciny e a Lulu. Minha opinião era de que o Gerald, como de praxe, iria mexer no resultado. Por isso, a opinião ficaria para depois. À la Kant, suspendi meu juízo. Ontem assisti pela segunda vez ao espetáculo. E para minha surpresa muito pouco mudou. Então era isso mesmo. Lembro de que minha última imagem do palco foi ter visto o Gerald saindo orgulhoso. A Franciny disse meu nome a alguem da produção, pedindo para falar com o Gerald. Ele não iria atender, e não atendeu. Lembro-me agora de Terra em trânsito, a peça dele com a Fabi (Fabiana Guglielm...

4.48 Psicose (peça de Sarah Kane, tradução de Laerte Mello)

Há realmente algo de muito estranho e forte nesta última peça da Sarah Kane. E não é porque ela se matou em seguida, aos 28 anos. O assunto é claro desde o começo: uma depressão mortal. É como se fosse um testamento. Muitos lados da questão são expostos de forma esparsa - não sei se todos nem se isso afinal é possível -, e ao final da leitura a gente fica com um sabor amargo na boca. Dá vontade de reler, muito embora passe o desejo de decifrar. Isto torna-se secundário, aqui. Há algo que permanece, e creio que isso se deva à qualidade do que é feito e à integridade do que é dito. Pego por exemplo, já na primeira página: "corpo (...) contém uma verdade que ninguém nunca fala". É óbvio do que se trata: da extrapolação do fisiológico, de uma lógica de que por mais que se tente diagnosticar "nunca se fala". Abre-se uma porta à compreensão disso que não sabemos muito bem o que é. A força de "Lembre-se da luz e acredite na luz/ Um instante de claridade antes da ...

29/7 (a partir de 28) - Teatro e artes

Ontem, ao ouvir o Gerald, quanto a como coloca a musica (depois), e depois ainda, ao ver uma musica passando pela partitura (e me deixando uma impressao de impossibilidade de traducao em algo mais), percebi que a arte finalmente havia voltado a assumir um lugar inextrincavel em mim. Finalmente percebi novamente que ela existia em mim para algo alem da minha vida, e percebi tambem que qualquer motivacao extemporanea (tipo celebridade, valor em si, razao) para ela era, alem de inutil, irrelevante. Percebi isso e na hora me libertei de coisas ao meu redor imensas, que me faziam sentir amargurado por um peso muito grande. Como se eu DEVESSE atribuir algo aa minha vida por me sentir pequeno demais para tudo o que investi nela. Isso fez com que eu tambem entendesse que, quando QUALQUER COISA for bem feita, ja EE arte em si, e por isso mesmo entendi o valor da edicao no cinema, da atuacao, da luz e tudo mais. Tudo adquiriu de repente um valor maior, para alem da vida inclusive.