Pular para o conteúdo principal

Uma boa atuação

Ontem, foi a antepenúltima apresentação de Dias e Noites, peça do Lucas Mayor, dirigida pelo Marião. A plateia estava quase cheia e desde o começo da peça surpreendeu a reação de alguns espectadores, que ou riam demais em momentos estranhos - nada cômicos -, ou começavam a falar entre si, atrapalhando os atores.
Eu esperava que eles, os espectadores, estivessem bem acesos quando entramos, a Majeca e eu, e foi o que aconteceu. Houve as reações de praxe a gags que cometo bem no começo, e muitos dos espectadores riam bastante das frases da Majeca. Percebi que esse público ria do que entendia, e não tanto do que sentia pelo jeito de fala do ator/atriz.
Tudo foi a contento até o fim, quando Pedro - eu - descobre que a Soraya não é quem imaginava. Eu, como descobrimos nas últimas apresentações, dei pausas calculadas na fala, de forma a atribuir mais dramaticidade, mas senti que ninguém ria. Ninguém ria mesmo. Normalmente nesse ponto as pessoas riem do patético do personagem. Mas desta vez não, ninguém ria - ou, diria eu - não posso confirmar -, sorria. Ao final da fala, então, quando falo do cocô aconteceu um silêncio realmente sepulcral. Eu tentei caprichar, admito, mas acho que extrapolou. Pensei, na saída, eles SENTIRAM PENA de mim, do personagem, tanta pena que os impediu de rir do que acontecia.
Saímos do teatro e encontrei vários espectadores, e eles estavam exultantes. Me olhavam com real satisfação. Estavam felizes, sorrindo. Me cumprimentaram, agradeci, como sempre, e saí. Conversei com dois deles, que não conhecia, e eles admitiram: sentiram pena. Muita pena. Mas foi ótimo. Adoraram.

Eu diria que, sem sombra de dúvida - para mim -, foi indiscutivelmente minha primeira boa atuação. Evoé.

Foto: Gisela Schlögel

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Gargólios, de Gerald Thomas

Da primeira vez que assisti a Gargólios, do Gerald (Thomas), na estréia, achei que não havia entendido. Alguns problemas aconteceram durante o espetáculo (a jovem pendurada, sangrando, passou mal duas vezes, as legendas estavam fora de sincronia, etc.) e um clima estranho parecia haver tomado conta do elenco - ou pelo menos assim eu percebi. De resto, entrei mudo e saí calado. Mas eu já havia combinado assistir novamente o espetáculo, com a Franciny e a Lulu. Minha opinião era de que o Gerald, como de praxe, iria mexer no resultado. Por isso, a opinião ficaria para depois. À la Kant, suspendi meu juízo. Ontem assisti pela segunda vez ao espetáculo. E para minha surpresa muito pouco mudou. Então era isso mesmo. Lembro de que minha última imagem do palco foi ter visto o Gerald saindo orgulhoso. A Franciny disse meu nome a alguem da produção, pedindo para falar com o Gerald. Ele não iria atender, e não atendeu. Lembro-me agora de Terra em trânsito, a peça dele com a Fabi (Fabiana Guglielm...

4.48 Psicose (peça de Sarah Kane, tradução de Laerte Mello)

Há realmente algo de muito estranho e forte nesta última peça da Sarah Kane. E não é porque ela se matou em seguida, aos 28 anos. O assunto é claro desde o começo: uma depressão mortal. É como se fosse um testamento. Muitos lados da questão são expostos de forma esparsa - não sei se todos nem se isso afinal é possível -, e ao final da leitura a gente fica com um sabor amargo na boca. Dá vontade de reler, muito embora passe o desejo de decifrar. Isto torna-se secundário, aqui. Há algo que permanece, e creio que isso se deva à qualidade do que é feito e à integridade do que é dito. Pego por exemplo, já na primeira página: "corpo (...) contém uma verdade que ninguém nunca fala". É óbvio do que se trata: da extrapolação do fisiológico, de uma lógica de que por mais que se tente diagnosticar "nunca se fala". Abre-se uma porta à compreensão disso que não sabemos muito bem o que é. A força de "Lembre-se da luz e acredite na luz/ Um instante de claridade antes da ...

algo sobre wilson e kantor

difícil não se sentir provocado ao ler e refletir algo sobre o legado de bob wilson. digo ler e refletir porque nunca vi nada DELE. e aquilo que tem no youtube, embora bonitinho, deixa demais a desejar, após ter lido o livro do galizia (os processos criativos de robert wilson). o fato é que ele, assim como o kantor, deixam-me a impressão de não, nunca ter assistido a nada similar àquilo que eles há tempos já fizeram. como sentir um déja vu face um espetáculo em que nada acontece, e em que os vivos mais parecem mortos, e os mortos (bonecos) como que expressam a vida (kantor)? (se é que eu entendi bem). dele, do kantor, a gente acha algo mais convincente no youtube. mas do wilson, nada. ou muito pouco. bob wilson convenceu-me por exemplo de que não precisamos seguir a rota dos clássicos - e por clássicos me refiro a todos esses que vemos citados aqui e acolá, por gente culta ou nem tanto, como referidos à arte contemporânea. não, realmente não preciso - mas posso querer - ler sobre o fut...