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Um branco

Não desejo a ninguém que esqueça sua fala no meio ou começo de uma peça.
Mas foi isso que aconteceu ontem comigo. Eu mal entrara na cena e de repente travei.
Digo-lhes que a sensação é HORRÍVEL. Dá para sentir FISICAMENTE o tempo se fechando. Não, não me refiro a nuvens. Refiro-me que, a cada segundo, a cena torna-se mais opressiva, e nós, que estamos no redemoinho, não podemos recuar. Só existe andar para a frente. Toda cena é PARA A FRENTE. Não existe a possibilidade de recuo, de forward, de rewind, não existe mesmo. E TUDO ESTÁ EM NOSSAS MÃOS.
A solução foi ir direto ao ponto em que minha partner, a ótima Majeca, pega o touro pela unha. Eu já havia feito isso em outro momento de esquecimento, e daquela vez a Helena Cerello foi quem pegou o touro.
A desolação que a gente sente depois que a cena termina e somos obrigados a nos defrontar conosco é indescritível. Entendo claramente por que determinados atores ou atrizes, cobrados por seus diretores, que os formataram, ficam quase traumatizados com a sensação. É foda. Muito pior do que imaginam.

Ainda bem, contudo, que conseguimos, a Majeca e eu, conduzir a cena como deveria a partir de então - na verdade, até experimentamos saídas que antes não haviam sido tomadas. Foi interessante. E o pessoal gostou. Mas o sofrimento, VOCÊS NEM IMAGINAM COMO É.

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