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Alguns pensamentos sobre a viabilidade e a necessidade do teatro

Nas últimas semanas, tenho lido VERDADEIRAMENTE MUITO sobre teatro. Não lido teatro (peças), nem teorias (livros que se propõem tornar o pensamento sobre o teatro alguma coisa coerente historicamente). Lido sobre teatro, digo, lido sobre a viabilidade e necessidade do teatro.
Não minto. O formato do teatro - a necessidade de montar um grupo, torná-lo coeso, adaptar peças, realizar ensaios e tudo o mais - nunca me agradou, definitivamente. Isso porque nunca me convenci de que esse formato seria viável, de que seria possível criar e manter um teatro de qualidade submetendo-se às regras da vida. Por isso com o passar do tempo minhas atenções se voltaram, não ao ineditismo das peças, nem à qualidade das montagens, mas ao trabalho do ator. Pensava, se conseguíssemos manter um trabalho de atuação inovador poderíamos posteriormente fazê-lo migrar a outros meios mais viáveis, como o cinema, o vídeo ou mesmo a televisão. Pensava isso.
Mas um livro e algumas reflexões mostraram-me que estava errado.
O teatro é uma arte submetida a práticas milenares que, no conjunto, consistem realmente em um trabalho coerente de RESISTÊNCIA. Pouco importa, nesse sentido, se o teatro pode ou não se manter. Importa que ele precisa ser defendido por aqueles que nele acreditam - tal qual o homem no conto A Terceira Margem do Rio.
Não nego. Contrariamente ao que eu imaginaria, quem me convenceu da inviabilidade crônica do teatro foi pura e simplesmente Eugenio Barba - que usou esse conto do Guimarães Rosa, e ele assim o afirma, explicitamente, para defender seu chamado Terceiro Teatro (muitas águas se passaram e essa proposta de Barba virou história, mas cabe citá-la).
Convenci-me de que o teatro é uma arte que, se é defendida seja por quem for, não pode depender de parâmetros de sucesso para se impor na história e no trabalho da arte. A luz me veio quando soube, por Barba, que Grotowski, nos seus primeiros anos, encenava peças para 3 ou 4 pessoas. Sim, para 3 ou 4 pessoas. E deixou sua marca. Por quê? Porque, seja como for, insistiu em sua busca e acabou criando um teatro eterno. Um tipo de teatro que acabou se tornando ou mostrando eterno.
Convenci-me ainda mais porque percebi que por trás de sua fala, da fala de Barba, sempre há um trabalho de resistência e por que não de revolta. Haveria algo errado no mundo, tal qual ele se conduz. Seria necessário defender uma forma de escapar das amarras desse mundo sempre criador de mais e mais amarras. Daí que muito do que ele defende acaba se reapropriando dos parâmetros da liberdade e do amor.
Um livrinho que me levou ainda mais a esse tipo de reflexão foi o Pedras d'água, de Julia Varley, também participante do Odin Teatret, da Dinamarca (antes eu havia posto o Odin na Noruega, lugar pelo qual ele passou). Isso porque, embora num primeiro instante eu ter realmente antipatizado com sua forma aparentemente desconexa de entender o teatro, puro e simplesmente, pegando as páginas aqui e acolá reparei o quanto o seu trabalho como atriz foi dependendo, pura e simplesmente, do trabalho com o Outro, seja ele o diretor - com o qual não se deu bem durante muitos anos -, seja com os companheiros, sujeitos às mesmas provações tendo em vista um resultado teatral que lhes escapava.
Então acabei percebendo que, ao realizarmos as cenas que realizamos, no Sarau da Terça, nós também somos resistentes. Que nós escolhemos o teatro por acreditarmos nele, pura e simplesmente. Que a qualidade do que viermos a propor será condizente com a dedicação que lhe dermos, com a integridade de nossa procura, que pode, a depender da integridade de nossa busca, nos levar mais ou menos longe. Mas que isso deve independer do chamado sucesso. De se atender às expectativas do público. Agora finalmente entendi.

Não sei se me fiz entender muito bem, mas agora percebo por que considero a mim mesmo um resistente, por que continuo em busca sem precisar do apoio de mais ninguém. É porque realmente acredito no teatro, nesse teatro que vez ou outra vejo por aí e que não consigo realmente decupar ou simplesmente analisar. Pois o todo não é a soma das partes. É mais. Esse mais é que é o teatro.

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