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Bichado (de Tracy Letts, dir. Zé Henrique de Paula)

Tracy Letts é o autor da moda. Seja por filmes (Álbum de Família), seja por peças (Killer Joe, e esta, Bichado), o norte-americano tornou-se o queridinho de muitos que apostam num teatro hiperrealista e com mensagens subliminares interessantes.
Esta montagem de Bug (nome original), dirigida por Zé Henrique de Paula, aposta, como o próprio Letts indica no original, num hiperrealismo ferrenho para contar a história de um ex-recruta que acaba caindo nos amores de uma mulher, uma garçonete, que vive só e que lhe dá guarida, a ele e aos seus fantasmas.
Porque ele, personagem, tem fantasmas, e eles dizem respeito a "bichos", insetos, corpúsculos que, ele diz, tomam conta dele e do ambiente em que ele se aloja, sem se saber por quê. No começo, os insetos meio que "aparecem" por ruídos cuja fonte é então determinada. Depois eles aparecem mesmo, na cama - ele os vê, ela não -, no quarto, na sala, em todo lugar.
O clima claustrofóbico criado pela direção num cenário construído em minúcias - hiperrealista - consegue atribuir à trama algo mais do que ela aparenta, clara e simplesmente. Pois se se restringisse a isso talvez caísse num marasmo - o que não acontece. Somos então levados à neura dos personagens, num crescendo que envolve morte, revelações e pavor - para terminar, como em Killer Joe, numa espécie de clímax-êxtase. É interessante ver como dois diretores de peso - Zé Henrique e Mário Bortolotto - tratam esse autor recente que já tem pintas de clássico - contemporâneo, mas clássico.

A peça será apresentada mais três vezes no Viga, do lado da estação Sumaré do metrô. O Núcleo Experimental assina o espetáculo como um todo. 

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