Pular para o conteúdo principal

O Homem das Multidões (dir. Marcelo Gomes e Cao Guimarães)

A estreia da nova banda do Marião, A Carne é Fraca, e a (minha) retomada das resenhas sobre peças de teatro levaram-me a sair de onde me escondo para encarar o que eu nem sabia o que era. Mas acabei me direcionando a local mais próximo e embarquei, sem saber que era lançamento, no filme desses brasileiros, ambientado em MG. O que me atraiu em especial foi a foto do cartaz, e não nego que ao saber que era um filme brasileiro - apesar das ótimas surpresas nos últimos anos - eu meio que refleti, será? Ocorre que havia uns blockbusters outros no mesmo Itaú Augusta, com diretores badalados.
Esqueci, tomei meu café, cogitei um livro e entrei. Fiquei bem no centro do cinema - quase ao lado de umas mal-educadas que nem vale a pena a perda de tempo.
Ocorre que o filme dos caras pegou minha atenção.
É difícil explicar por quê. Eu queria - ou achava que queria -, na ocasião, ver um filme que me motivasse uma reflexão, mas a simplicidade da trama dos caras me cativou. Mas, mais importante, a forma pela qual os caras conduziram os atores. O ator principal, um cara comum, lá pelos 40 e poucos, não chama definitivamente a atenção. Um homem de meia idade, nem bonito nem feio, pouco atlético, com um olhar vago, morando numa quitchenete super mal-mobiliada, no centro da cidade, que mal consegue nutrir a própria geladeira de comida, com um copo de vidro, com coisas espalhadas pela sala do lugar, que dorme no sofá, que parece não ter qualquer amigo, que nem fala direito, se fala. Ocorre que ele trabalha com uma menina, bem bonita por sinal, e almoça com ela, sendo que ela arrumou um casamento com um cara que conheceu num site de relacionamentos. Eles praticamente não conversam, e ela o convida para ser seu padrinho de casamento. Ele reluta, mas aceita, brincando com a ideia de ser padrinho. A trama assim vai, com o Jean-Claude Bernardet fazendo uma ponta sintomática como o pai da garota, e nada demais acontece. Ao final, ela aparece desolada - após o casamento -, e ele - não me lembro! - continua sozinho.
Claro, a solidão é o mote, mas não uma desculpa. A gente SENTE a história dos personagens nos closes ilimitados que os diretores fazem deles, nos olhares que vão e vêm, nas desolações presentes naquilo que NÃO EXISTE, em histórias que parecem fadadas a não existirem. Esses closes é que me pegaram a atenção, pois são o SÍMILE exato daquilo que busco no grupo de teatro que tenho. Quero os closes, quero as histórias nos detalhes dos rostos, e isso é algo que eles, os diretores, conseguem de forma magistral.
Um detalhe importante diz também respeito à EMPATIA criada pelos personagens do filme nos espectadores, que riram diversas vezes durante a fita, quase sempre no que se referia à POBREZA patética da história dos dois, dos protagonistas. Pobreza íntima, digo, não pobreza de fato. Há algum tempo que eu não via tamanha identificação da plateia com o que acontecia na tela.
Saí bem leve e contente, apesar da POBREZA rica da fita - e encontrei o Allan e a Ana à saída com colega (deles) que me reconheceu de apresentação-performance no ano passado. Conversamos e - Jung explica - tudo fez sentido. Não sobre o filme, sobre o futuro, o presente e o futuro.

A vida é bela.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Gargólios, de Gerald Thomas

Da primeira vez que assisti a Gargólios, do Gerald (Thomas), na estréia, achei que não havia entendido. Alguns problemas aconteceram durante o espetáculo (a jovem pendurada, sangrando, passou mal duas vezes, as legendas estavam fora de sincronia, etc.) e um clima estranho parecia haver tomado conta do elenco - ou pelo menos assim eu percebi. De resto, entrei mudo e saí calado. Mas eu já havia combinado assistir novamente o espetáculo, com a Franciny e a Lulu. Minha opinião era de que o Gerald, como de praxe, iria mexer no resultado. Por isso, a opinião ficaria para depois. À la Kant, suspendi meu juízo. Ontem assisti pela segunda vez ao espetáculo. E para minha surpresa muito pouco mudou. Então era isso mesmo. Lembro de que minha última imagem do palco foi ter visto o Gerald saindo orgulhoso. A Franciny disse meu nome a alguem da produção, pedindo para falar com o Gerald. Ele não iria atender, e não atendeu. Lembro-me agora de Terra em trânsito, a peça dele com a Fabi (Fabiana Guglielm

(Em) Branco (de Patricia Kamis, dir. Roberto Alvim, Club Noir, 3as a 5as durante o mês de agosto)

Fui à estreia da segunda peça da leva de oito novos selecionados que o Alvim vai encenar municiado de sua leitura na noite anterior. Esperava ver algo relativamente tradicional e nutria um certo receio de déja vu. A atriz e os dois atores permanecem estáticos em quadrados iluminados por baixo. O caráter estático não se refere apenas ao corpo em contraponto com o rosto, mas também a este, mutável apenas (e repentinamente) por expressões fugazes. Os olhares permanecem fixos. O texto segue a ordem 1, 2, 3 (segundo o Alvim, emissores mas não sujeitos), que eu imaginava que iria entediar. As falas são ora fugazes ora propositalmente lentas e sua relação tem muito a ver com o tempo assumido em um e outro momento. Não irei entrar no âmago da peça. Nem irei reproduzir o que a própria autora, o dramaturgo Luciano Mazza e o próprio Alvim disseram no debate posterior a ela. Direi apenas que durante ela nossa sensibilidade é jogada de um lado a outro num contínuo aparentemente sem fim sem c