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A emoção no ator

É pequena minha experiência como ator, eu sei. 4 peças em um ano, sendo uma em duas temporadas no meio da semana (um dia). Pode parecer pouco - e é. Mas aprendo rápido e toda apresentação é todo um aprendizado que serve para entender as atuações dos outros e para tentar aprofundar as reflexões sobre a emoção no ator.
Quando dirigi minha primeira peça - numa escola, com três atores - eu não sabia de praticamente nada. Mas eu insistia, por instinto, com o ator principal que ele não deveria se emocionar, mas ao contrário conseguir emocionar os espectadores. Ele o conseguiu e foi bem bonito. Mas meu estilo de direção era tosco, para falar o mínimo. Passaram-se vários anos até que alguém me desse um papel, logo a mim que nunca tinha atuado. Foi um aprendizado muito esclarecedor. Seria inútil repassar tudo aquilo por que passei, por isso acreditem: aconteceu muita coisa e muita coisa ficou.
Mas também montei um grupo e tive de ler muito e refletir bastante a respeito de onde eu quero me dirigir com minhas atrizes e atores. Qual é o ismo a que me sujeito? O realismo? O naturalismo? O expressionismo? Outros ismos? Quem, dentre os que estão por aqui, faz realmente minha cabeça? O que realmente faz minha cabeça? A atuação? A direção? O quê, afinal?
Nessa trajetória, acabei chegando em Grotowski, com o qual compartilho vários de seus pressupostos. Nunca vi nada que o grupo dele tivesse feito, apenas imagino. O Lume é um grupo, aqui no Brasil, que segue essa linha. Nada deles eu ainda consegui ver. Nem me aproximei do Lume, que fica em Campinas. Fico meio constrangido, hoje, ao pensar em fazer isso porque acabei me acostumando a seguir meu próprio caminho. E esse caminho não consiste em fazer o ator expressar emoções. Como antes, eu cada vez mais estou convencido de que a emoção precisa ficar de fora do ato do ator.
Mas Grotowski seguia uma linha bem determinada, que era, no começo de sua carreira, avançar no desenvolvimento do personagem de forma a que, sendo representado, ele conseguisse revelar, por meio do trabalho do ator, determinadas sensações aferidas da vivência deste último. Eu já transcrevi há algumas semanas um trecho de um livro dele em que ele explica como um de seus atores percorreu essa trajetória e conseguiu feitos memoráveis - refiro-me à peça O Príncipe Constante.
Eu busco algo similar. Pois percebo que ao tratar meu ator como pessoa e não como alguém a ser dirigido aqui e acolá, e ao trabalhar a conexão entre as cenas que faço especificamente para os atores entendo que eles só irão avançar na dramaticidade do personagem se empreenderem uma viagem dentro de si mesmos em busca do tópico que se encaixe. Quero por enquanto ver isso em seus rostos. Não busco corpo, por enquanto.

Pois bem. Isso reforça minha convicção de que, se a busca deve ser interna e emocionante, o resultado não poderá sê-lo, ao menos enquanto emoção que o ator possa sentir. Para conseguir nosso intento precisarei reforçar que, na hora da atuação, nada de emoção poderá ser permitida. Como, aliás, acontece comigo sempre que represento. Sinto-me meio enganador, na hora, pois as pessoas embarcam nisso que estou fazendo. Mas fazer o quê, é minha função.

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