Pular para o conteúdo principal

Teatro ou morte

Entrei na lide do teatro por email.
Foi por email que conheci o Gerald (Thomas) e que ele se comoveu.
Depois conheci ele pessoalmente e ele me deixou assistir aos ensaios de suas peças.
O resto é história - não vou ficar me estendendo, que é muito chato.
Lembro-me de quando ele me jogou aos leões - no palco do Sesc Vila Mariana, lotado. Foi um fiasco, pela avaliação comum. Para ele, foi lindo. Para mim, foi tudo.
Lembro-me como se fosse hoje. Vi o palco todo vazio. Entrei e vi vultos de cabeças. Não consegui enxergar ninguém. Na verdade, olhando mais de perto, vi. Quebrei a quarta parede. Pela primeira vez no palco, fiz o que não deveria ter feito.
Hoje o lugar no mundo em que me sinto mais à vontade é no palco. Mais que em casa - e tenho casa.
A última vez que pisei o palco - num teatro - foi no Parlapatões. Na Bestas Mortes, da Lulu Pavarin. O tempo, lá, pára. A gente faz o que tem de fazer - mas o mundo poderia acabar que não faria a menor diferença. Estamos numa cápsula, e a quarta parede é o que mantém tudo coeso.
Mas o Diogo Granato me ensinou que qualquer lugar pode ser o palco. E como entrar nele. A última vez que pisei nesse tipo de palco foi nos ensaios da oficina que faço lá no Bexiga. Mas a penúltima vez é que interessa - foi num centro cultural na Vila Madalena. Lá, eu simplesmente me apropriei de minhas palavras e desapareci. Me impediram de voltar, para não tirar a graça. Ganhei uma graninha.
Agora muitos que conheço no ambiente estão em dificuldades. Para fazer o teatro viver, é preciso grana e mais grana, que não precisa ser muita, mas que precisa bastar. E falta.
Por isso, e por outros motivos, é preciso trabalhar.
Contribuo na revista virtual do Ruy Filho, Antro Positivo, e agora na Revista Viciosa Trupe, de Viçosa, Minas Gerais. Esta última é conquista recente e do mesmo jeito que sempre aconteceu - convidado. Vamos ver no que vai dar.
Mas sei que posso fazer alguma coisa.
O alcance do que faço é bem limitado - mas é algo.
A profundidade do que faço também é limitada - mas é algo a que me dedico com muito afinco.
Podem haver vários outros caminhos por aí, e pretendo trilhá-los.
Mas antes de mais nada precisamos todos nós, que amamos teatro, que precisamos lutar e juntos.
Hoje vai ter show do pessoal do Marião. Estou sem um puto mas vou e pagarei a consumação. É preciso pôr a mão no bolso. É preciso estar presente e ajudar de várias formas.
Logo pretendo escrever algo sobre tudo o que vejo por lá e quem sabe cause alguma marola.
Pode ser que não dê em nada, mas uma andorinha faz, sim, verão.
Verão.

PS: Esqueci. Agora há pouco, o Marião postou uma mensagem no face comentando esse negócio do pague quanto puder. Eu me senti meio constrangido. Pois teve uma vez que eu não tinha um centavo - tive que pedir, mesmo assim, para eu conseguir ingresso. Outras vezes dei 2 reais - mas foram poucas. Quando está tudo bem, dou 5, que é o que costumo poder. Mas geralmente tô mesmo na merda. O problema é que o teatro precisa viver, e não vão ser durangos como eu que poderão fazer a diferença. Tenho meus planos, claro, mas são apenas planos. Para os outros, há a realidade. Que geralmente dói.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Gargólios, de Gerald Thomas

Da primeira vez que assisti a Gargólios, do Gerald (Thomas), na estréia, achei que não havia entendido. Alguns problemas aconteceram durante o espetáculo (a jovem pendurada, sangrando, passou mal duas vezes, as legendas estavam fora de sincronia, etc.) e um clima estranho parecia haver tomado conta do elenco - ou pelo menos assim eu percebi. De resto, entrei mudo e saí calado. Mas eu já havia combinado assistir novamente o espetáculo, com a Franciny e a Lulu. Minha opinião era de que o Gerald, como de praxe, iria mexer no resultado. Por isso, a opinião ficaria para depois. À la Kant, suspendi meu juízo. Ontem assisti pela segunda vez ao espetáculo. E para minha surpresa muito pouco mudou. Então era isso mesmo. Lembro de que minha última imagem do palco foi ter visto o Gerald saindo orgulhoso. A Franciny disse meu nome a alguem da produção, pedindo para falar com o Gerald. Ele não iria atender, e não atendeu. Lembro-me agora de Terra em trânsito, a peça dele com a Fabi (Fabiana Guglielm...

4.48 Psicose (peça de Sarah Kane, tradução de Laerte Mello)

Há realmente algo de muito estranho e forte nesta última peça da Sarah Kane. E não é porque ela se matou em seguida, aos 28 anos. O assunto é claro desde o começo: uma depressão mortal. É como se fosse um testamento. Muitos lados da questão são expostos de forma esparsa - não sei se todos nem se isso afinal é possível -, e ao final da leitura a gente fica com um sabor amargo na boca. Dá vontade de reler, muito embora passe o desejo de decifrar. Isto torna-se secundário, aqui. Há algo que permanece, e creio que isso se deva à qualidade do que é feito e à integridade do que é dito. Pego por exemplo, já na primeira página: "corpo (...) contém uma verdade que ninguém nunca fala". É óbvio do que se trata: da extrapolação do fisiológico, de uma lógica de que por mais que se tente diagnosticar "nunca se fala". Abre-se uma porta à compreensão disso que não sabemos muito bem o que é. A força de "Lembre-se da luz e acredite na luz/ Um instante de claridade antes da ...

(Em) Branco (de Patricia Kamis, dir. Roberto Alvim, Club Noir, 3as a 5as durante o mês de agosto)

Fui à estreia da segunda peça da leva de oito novos selecionados que o Alvim vai encenar municiado de sua leitura na noite anterior. Esperava ver algo relativamente tradicional e nutria um certo receio de déja vu. A atriz e os dois atores permanecem estáticos em quadrados iluminados por baixo. O caráter estático não se refere apenas ao corpo em contraponto com o rosto, mas também a este, mutável apenas (e repentinamente) por expressões fugazes. Os olhares permanecem fixos. O texto segue a ordem 1, 2, 3 (segundo o Alvim, emissores mas não sujeitos), que eu imaginava que iria entediar. As falas são ora fugazes ora propositalmente lentas e sua relação tem muito a ver com o tempo assumido em um e outro momento. Não irei entrar no âmago da peça. Nem irei reproduzir o que a própria autora, o dramaturgo Luciano Mazza e o próprio Alvim disseram no debate posterior a ela. Direi apenas que durante ela nossa sensibilidade é jogada de um lado a outro num contínuo aparentemente sem fim sem c...