O Lucas Mayor, amigo aqui de face, levantou a lebre. Segundo ele, a peça do velho Buk adaptada pelo Marião trata da solidão inelutável. A esse respeito, o Lucas fez um lindo texto, que o Marião repercutiu. Coincidência, encontrei o cara prestes a vermos Fatia de Guerra, do Andrew Knoll, no Club Noir. Cumprimentei e elogiei o seu texto. Mas ele preferiu ficar só.
Tenho visto a peça do pessoal do Cemitério diversas vezes (até agora, quatro). O suficiente para poder entrar na trama e dela me afastar, um pouco mais reflexivo. Vez ou outra, reparo em mais camadas nos personagens, e minha leitura muda ligeiramente. Mas no geral continua na mesma. E concluo que essa leitura não contempla necessariamente a solidão, tal qual o vê o Lucas. Ou seja, sinto discordar.
Minha fixação no Buk descansa em grande parte em sua trajetória. E é - creio - por isso que tanto me vejo retirar das peripécias a que Chinaski, o alter-ego do Buk e encarnado pelo Marião, parecem se meter. Mas a peça gira ao redor de um tema: as mulheres.
O Lucas vê que o Chinaski luta mas acaba sendo engolfado pela solidão. Ou seja, mulheres vão e vêm e ele permanece sozinho. Não sei. Para mim, há, sim, esse aspecto, mas ele não me parece o mais relevante. Ao contrário, vejo que é o desejo a paixão que tudo perpassa, que anima, domina, deturpa e leva Chinaski ao desespero, e que tanto o impede de encontrar a si mesmo. Um desejo que por vezes assume a forma de um dever, e outras, a forma de um curtir hedonista livre de qualquer culpa.
Chinaski começa a peça com 50 anos, há 4 sem mulher, sem experiências relevantes e sem saber como chupar buceta. Lydia aparece e ele finalmente escapa do seu destino. No começo, Chinaski não tem desejo, ou, se o tem, o tem enquanto potência a ser comprovada. Ele parece não ter norte a guiar a vida, em sua relação com as mulheres. Conhece Lydia e o desejo é ativado. Aprende a curtir o sexo e passa a guiar-se por mais e mais.
A ingenuidade masculina de Chinaski aparece quando ele diz ter-se apaixonado por Lydia. Mas aí surgem os contratempos. Ela não se adapta a suas idiossincrasias (algumas delas, não gostar de gente e gostar de beber até cair chapado) e passa a assumir um ciúme doentio com o qual é impossível lidar. Chinaski começa a afastar-se de Lydia, sempre de forma condoída, até romperem em definitivo. A ele foi revelado um mundo, o das mulheres disponíveis, em que ele se refestela e tenta, como pode, se manter ileso. Não busca relação. As mulheres aparecem e ele se deixa engolfar pelo... desejo. Amor? Algo que não parece existir. Relação, algo a que ele não parece se limitar.
Eis que ele surge de repente de camiseta e bem mais seguro na vida. Não aceita mais deixar de comer quem aparece em sua sopa. O desejo transita com facilidade em sua vida. Ele está mais de bem com a vida. Encara o desejo como algo positivo, que lhe dá vontade de viver. Não como antes, quando reflete naquilo que quer. Velho e feio, o que quer com tantas mulheres? Fugir do destino? É o que ele diz ANTES. Depois, a trajetória é diferente.
Há momentos em que a situação parece fugir do controle. Ele já não consegue dizer não a si mesmo, ao seu desejo. Aparece nova mulher, ele vai de cabeça e a come. Cria relações, mas estas sempre perigam pela incapacidade que ele expressa de poder conduzir o seu desejo. Surge uma dançarina do ventre. Ele havia marcado o dia de ação de graças com Debra, a namorada. Mas ele também havia marcado com Sara, a única que não aceita sexo antes do casamento. Sente-se tolhido em sua liberdade, abre-se com Debra e esta se zanga e rompe com ele. Chinaski parece não se importar muito. Como parece também não se importar com o virtual rompimento com Sara, justo ela, tão boa para ele. Chinaski parece dominado por força interna que insiste em deixá-lo... só. Importa é não decepcionar na satisfação de um desejo que aparece pelo simples aparecimento de uma nova mulher. Mas ele se sente cada vez mais perdido. Não sabe mais o que quer, se é que quer. Ao final, vence ao recusar a visita de uma nova jovem admiradora. Dominou o desejo. Entrou em paz consigo mesmo.
Estou lendo o livro do Buk que deu origem à peça. Nele, é possível perceber que os personagens têm mais nuances que na peça. A Lydia do livro, por exemplo, é bem mais sofisticada que a Lydia ciumenta e perdida da peça (e a Erika, que faz a personagem, concorda). Mas estou ainda no começo. Não posso dizer que esta leitura (acima) possa então necessariamente se sustentar a partir do livro. Mas é a leitura que sinto predominante ao assistir a peça.
Claro que no fundo pouco importa. A necessidade de decifrar é às vezes simples resultado de uma angústia da razão. Isso não significa que ela seja necessária. Pode-se muito viver e conviver sem chegar a qualquer conclusão. Eu simplesmente quis jogar para vocês algo que surgiu meio que de repente e que serviu-me de norte nessa bagunça que parece ter sido a vida de Chinaski, digo, Bukowski.
Tenho visto a peça do pessoal do Cemitério diversas vezes (até agora, quatro). O suficiente para poder entrar na trama e dela me afastar, um pouco mais reflexivo. Vez ou outra, reparo em mais camadas nos personagens, e minha leitura muda ligeiramente. Mas no geral continua na mesma. E concluo que essa leitura não contempla necessariamente a solidão, tal qual o vê o Lucas. Ou seja, sinto discordar.
Minha fixação no Buk descansa em grande parte em sua trajetória. E é - creio - por isso que tanto me vejo retirar das peripécias a que Chinaski, o alter-ego do Buk e encarnado pelo Marião, parecem se meter. Mas a peça gira ao redor de um tema: as mulheres.
O Lucas vê que o Chinaski luta mas acaba sendo engolfado pela solidão. Ou seja, mulheres vão e vêm e ele permanece sozinho. Não sei. Para mim, há, sim, esse aspecto, mas ele não me parece o mais relevante. Ao contrário, vejo que é o desejo a paixão que tudo perpassa, que anima, domina, deturpa e leva Chinaski ao desespero, e que tanto o impede de encontrar a si mesmo. Um desejo que por vezes assume a forma de um dever, e outras, a forma de um curtir hedonista livre de qualquer culpa.
Chinaski começa a peça com 50 anos, há 4 sem mulher, sem experiências relevantes e sem saber como chupar buceta. Lydia aparece e ele finalmente escapa do seu destino. No começo, Chinaski não tem desejo, ou, se o tem, o tem enquanto potência a ser comprovada. Ele parece não ter norte a guiar a vida, em sua relação com as mulheres. Conhece Lydia e o desejo é ativado. Aprende a curtir o sexo e passa a guiar-se por mais e mais.
A ingenuidade masculina de Chinaski aparece quando ele diz ter-se apaixonado por Lydia. Mas aí surgem os contratempos. Ela não se adapta a suas idiossincrasias (algumas delas, não gostar de gente e gostar de beber até cair chapado) e passa a assumir um ciúme doentio com o qual é impossível lidar. Chinaski começa a afastar-se de Lydia, sempre de forma condoída, até romperem em definitivo. A ele foi revelado um mundo, o das mulheres disponíveis, em que ele se refestela e tenta, como pode, se manter ileso. Não busca relação. As mulheres aparecem e ele se deixa engolfar pelo... desejo. Amor? Algo que não parece existir. Relação, algo a que ele não parece se limitar.
Eis que ele surge de repente de camiseta e bem mais seguro na vida. Não aceita mais deixar de comer quem aparece em sua sopa. O desejo transita com facilidade em sua vida. Ele está mais de bem com a vida. Encara o desejo como algo positivo, que lhe dá vontade de viver. Não como antes, quando reflete naquilo que quer. Velho e feio, o que quer com tantas mulheres? Fugir do destino? É o que ele diz ANTES. Depois, a trajetória é diferente.
Há momentos em que a situação parece fugir do controle. Ele já não consegue dizer não a si mesmo, ao seu desejo. Aparece nova mulher, ele vai de cabeça e a come. Cria relações, mas estas sempre perigam pela incapacidade que ele expressa de poder conduzir o seu desejo. Surge uma dançarina do ventre. Ele havia marcado o dia de ação de graças com Debra, a namorada. Mas ele também havia marcado com Sara, a única que não aceita sexo antes do casamento. Sente-se tolhido em sua liberdade, abre-se com Debra e esta se zanga e rompe com ele. Chinaski parece não se importar muito. Como parece também não se importar com o virtual rompimento com Sara, justo ela, tão boa para ele. Chinaski parece dominado por força interna que insiste em deixá-lo... só. Importa é não decepcionar na satisfação de um desejo que aparece pelo simples aparecimento de uma nova mulher. Mas ele se sente cada vez mais perdido. Não sabe mais o que quer, se é que quer. Ao final, vence ao recusar a visita de uma nova jovem admiradora. Dominou o desejo. Entrou em paz consigo mesmo.
Estou lendo o livro do Buk que deu origem à peça. Nele, é possível perceber que os personagens têm mais nuances que na peça. A Lydia do livro, por exemplo, é bem mais sofisticada que a Lydia ciumenta e perdida da peça (e a Erika, que faz a personagem, concorda). Mas estou ainda no começo. Não posso dizer que esta leitura (acima) possa então necessariamente se sustentar a partir do livro. Mas é a leitura que sinto predominante ao assistir a peça.
Claro que no fundo pouco importa. A necessidade de decifrar é às vezes simples resultado de uma angústia da razão. Isso não significa que ela seja necessária. Pode-se muito viver e conviver sem chegar a qualquer conclusão. Eu simplesmente quis jogar para vocês algo que surgiu meio que de repente e que serviu-me de norte nessa bagunça que parece ter sido a vida de Chinaski, digo, Bukowski.
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