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Fatia de Guerra, de Andrew Knoll, em livro Procurado e Fatia de Guerra (7 Letras)

A peça é a sexta de uma série de oito que a Cia. Club Noir, do Roberto Alvim e da Juliana Galdino, está encenando na Mostra de Dramaturgia Contemporânea. O autor esteve presente à estreia, que contou com uma leitura ensaística do crítico Ruy Filho.


A menor das duas peças do livro, Fatia de Guerra navega nas lembranças de uma garotinha e do pai - que mata a cachorra da menina. En passant a diálogos e solilóquios sofridos a respeito, tanto dela quanto dele, vemo-nos envolvidos numa trama que remete a momentos de guerra, de cogumelo de bomba atômica a bombardeios, cuja origem desconhecemos mas que aparecem fortalecidos pelo contexto de amor e morte. A leitura pode refletir-se, no leitor, em leituras as mais diversas. É como se houvessem restos a serem reconstruídos, para não necessariamente, contudo, fazerem sentido.

Alvim explica que a peça foi a primeira da série escolhida a assumir um formato e formas de enunciação fora do usual, com texto espalhado pelas páginas em fontes e tamanhos diversos e sem indicação clara de sujeitos enunciadores, dentre outras novidades. Como ele explicou na estreia da peça, o texto foi no início considerado péssimo por todos os que o leram e avaliaram, e que só com o tempo o texto pôde ser compreendido em toda sua radicalidade. Hoje é considerado um clássico do gênero. Só isso já convidaria à sua leitura. Mas tem também outra coisa: ele não pode nem deve ser compreendido de uma forma unívoca em sua encenação, ou seja, traz um convite a encenadores que gostariam de experimentar novas formas e conteúdos de encenação. Em suma, é uma peça que não se restringe a si mesma, mas que convida a estender sua leitura a outros mundos.

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