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a vida - e a morte

acabo de ler em cronin, the last modernist, que o beckett da última fase não se reconhecia nas obras anteriores. na verdade, nem nessas que tanto considero beckettianas. beckett teria dito que não conhecia (mais) o autor daquelas obras.


o aspecto plástico, estético, é o que mais me atrai nas últimas obras dele. acho fantásticas as figuras cobertas de quad, por exemplo (aqui reproduzidas). teimo em considerar que a aventura humana tem essa cara, branco e preta, estilizada, sucinta e sincera.

mas não é assim que o mundo aparece.

o mundo aparece com facetas mais singelas. com pessoas, personalidades, personas e coisa que o valha (das quais o jung tanto falou, e não só ele).

podemos até nos sentir como nas figuras. mas somos algo bem mais concreto, bem mais trivial, bem mais humano. como se as figuras beckettianas da última fase fossem quase sobrehumanas (não digo superhumanas para não me fazer mal-entendido, nietzsche e coisa que o valha).

fato é que, tirando as pesquisas de sempre, é com o último beckett que na maioria das vezes acabo fechando. talvez no limite das forças. mas é assim.

enquanto isso, que venha a vida.

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