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Brincando com Fogo, de Strindberg (direção Nelson Baskerville)

Somos levados a entrar, mas de leve, na cerimônia e confraternização de um casamento. ocorre a cerimônia, os recém-casados comemoram, e surgem os pais da noiva, amigos, empregadas, tudo é uma festa. restrita a uma armação que coloca a todos numa espécie de aquário, de onde podemos ver todos como vemos ratinhos de laboratório. por vezes um ou outro sai, com isso mudando de plano e vídeos aparecem aos dois lados da armação comentando ou informando o que ocorre do lado de dentro.


aos poucos torna-se patente a relação conflituosa desses que tanto comemoraram. a dependência abjeta do ex-noivo pela esposa que ele prefere humilhar. a divisão interna de um amigo apaixonado pela esposa do amigo. o comodismo hedonista do pai do recém-casado. a incômoda situação da esposa que não se sente bem-amada. a empregada que busca outros desejos e que se rende a um ou a outro. os personagens não abandonam o visual de quem está de férias ao longo da beira da praia.

a peça propõe um final, que a companhia torna patente. mas a companhia propõe também o seu final. ao final, a clareza, como em todas as peças de strindberg, de que a relação a dois é algo que nasceu para não ser resolvido.

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