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A morte sorriu para mim (texto: Guilherme Junqueira ("Sugar"), leitura, lançamento do livro Intrigas Augustas, do "Sugar", Espaço Cemitério de Automóveis)


Vou ao lançamento do livro do Sugar Gay Leonard, o Guilherme Junqueira, premido pela necessidade de economizar. Não sei se me comoverei a comprar o livro. Chego e encontro o Sugar e amigos na entrada do Teatro Cemitério. São poucos amigos, mas amigos. O Sugar está com os livros à mostra. Pego um deles e o folheio mas não me decido. Ficará para depois.
Aí começa a leitura desse que é o último conto do livrinho. Sou pego desprevenido. Não sabia que haveria leitura. Não queria perder os curtas no Cine Parlapas, nos Parlapatões, às 23h, por isso nem sabia se conseguiria ficar até o fim. Mas fico. Respondo pela filmagem, um ou outro enquadramento mais focado, e por aí vai.
Fazem a leitura o Fernando Fecchio, a Lara Giordana, o próprio Sugar (com as rubricas) e o Pablo (Perosa).
A trama gira em torno de um sujeito, pintor, que convive com Celine, uma atriz. Convive em termos, pois desde já somos defrontados face à realidade: ela está morta. Mas ela invade sua vida. Aparece diante dele e o coloca em questão. Surgem os sonhos que a envolviam, os sonhos que envolvem o próprio sujeito, as perspectivas de gente como eles diante de uma cidade ruidosa e cruel. Uma certa Rua Augusta.
O texto é agil e - embora alguns reclamem que ele seja cheio de bifes que criam algo de inverossímil dos diálogos - bem interessante. Algumas sacadas - em reflexões - chamam-me a atenção, quase sempre tiradas em torno da mitologia urbana e artística de que todos nós, queiramos ou não, nos deixamos embebedar.
A primeira parte da peça, a maior, consiste no intrincado relacionamento entre o sujeito e Celine. As duas cenas restantes recolocam Celine no tempo, com sua morte, inclusive, e ao final entramos naquilo que se pode retirar da despedida das duas personagens. Um carinho potente que leva a amizade a um outro nível, e que nos faz enlevar de certo saudosismo emotivo.
Gosto da leitura e compro o livro. O Sugar faz dedicatória com suas "canetas" (falta-me a palavra) coloridas e dá tempo de chegar nos Parlapas. Irei ler a peça agora, e daí tiro minha impressão. Mas a leitura mostrou a existência de uma dramaturgia que, se não é potente, é interessante nesse afundar na cidade que Sugar tão bem representa.

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