Pular para o conteúdo principal

Um ensaio limitado mas que me acrescentou bastante

Na ausência do Loureiro, no Rio, as garotas e um amigo, quem sabe colega, aparecem no local de sempre e embarcamos em analisar cenas criadas aqui e acolá, por ela, ela e eu mesmo, sem muita convicção do que fazemos. Eu confesso que fiz as cenas - digo, as escrevi - muito apressadamente, só para ter algo a mostrar, mas me arrependi depois, pelo resultado e pelo patetismo daquilo que resultou. Não gostei do resultado, nem elas.
Ficamos então a analisar a cena que a Rê e o Luís irão apresentar no Wolf Maya como conclusão de módulo (terceiro, acho). Uma cena de desmascaramento de traição e de perda de controle no sentido de uma violência real (facadas). Como sempre, a Rê meteu-se com todas as energias no papel e o companheiro pareceu-me, comparativamente, fraco, enfraquecido - fazia parte do papel, também.
Ficamos todos divididos quanto a como fazer com que a ênfase no papel da Rê redundasse num verdadeiro estourar de emoções, algo que nos fizesse acreditar em que ela perdeu realmente a cabeça. Pensamos quanto à forma adequada de segurar a faca, e quanto aos passos que ele deveria ter de vantagem para que pudesse se afastar de um perigo iminente e - mais importante - conseguir abrir a porta, logo atrás, para finalmente escapar.
O que me interessou mais, em tudo, foi o fato de poder colocar minha razão e emoção, não em AVALIAR a cena, como se ela pudesse ser certa ou errada, ou mais certa ou mais errada, mas quanto à sua efetividade para quem a recebe, quanto ao seu choque ser verdadeiro, nada fingido, algo que dissesse mais da vida do que esta mesma. Eu gostei demais colocar-me no lugar de quem via e poderia fazer virar o jogo, pois em geral o que acontece é que fico insatisfeito e mal sei o que posso dizer, o que posso pensar e mensurar.
Num determinado momento, eu interrompo e digo o que acho, sem com isso desmerecer nada do que vi ou do que senti. Sinto-me bem, expressando o que vejo e reavaliando em mim o que acontece. Sinto-me numa roda de amigos - diretores, atores, produtores - que buscam a melhoria de nosso trabalho, do teatro, da atuação, da arte em suma. Entendo o dilema do Strasberg.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Gargólios, de Gerald Thomas

Da primeira vez que assisti a Gargólios, do Gerald (Thomas), na estréia, achei que não havia entendido. Alguns problemas aconteceram durante o espetáculo (a jovem pendurada, sangrando, passou mal duas vezes, as legendas estavam fora de sincronia, etc.) e um clima estranho parecia haver tomado conta do elenco - ou pelo menos assim eu percebi. De resto, entrei mudo e saí calado. Mas eu já havia combinado assistir novamente o espetáculo, com a Franciny e a Lulu. Minha opinião era de que o Gerald, como de praxe, iria mexer no resultado. Por isso, a opinião ficaria para depois. À la Kant, suspendi meu juízo. Ontem assisti pela segunda vez ao espetáculo. E para minha surpresa muito pouco mudou. Então era isso mesmo. Lembro de que minha última imagem do palco foi ter visto o Gerald saindo orgulhoso. A Franciny disse meu nome a alguem da produção, pedindo para falar com o Gerald. Ele não iria atender, e não atendeu. Lembro-me agora de Terra em trânsito, a peça dele com a Fabi (Fabiana Guglielm...

4.48 Psicose (peça de Sarah Kane, tradução de Laerte Mello)

Há realmente algo de muito estranho e forte nesta última peça da Sarah Kane. E não é porque ela se matou em seguida, aos 28 anos. O assunto é claro desde o começo: uma depressão mortal. É como se fosse um testamento. Muitos lados da questão são expostos de forma esparsa - não sei se todos nem se isso afinal é possível -, e ao final da leitura a gente fica com um sabor amargo na boca. Dá vontade de reler, muito embora passe o desejo de decifrar. Isto torna-se secundário, aqui. Há algo que permanece, e creio que isso se deva à qualidade do que é feito e à integridade do que é dito. Pego por exemplo, já na primeira página: "corpo (...) contém uma verdade que ninguém nunca fala". É óbvio do que se trata: da extrapolação do fisiológico, de uma lógica de que por mais que se tente diagnosticar "nunca se fala". Abre-se uma porta à compreensão disso que não sabemos muito bem o que é. A força de "Lembre-se da luz e acredite na luz/ Um instante de claridade antes da ...

(Em) Branco (de Patricia Kamis, dir. Roberto Alvim, Club Noir, 3as a 5as durante o mês de agosto)

Fui à estreia da segunda peça da leva de oito novos selecionados que o Alvim vai encenar municiado de sua leitura na noite anterior. Esperava ver algo relativamente tradicional e nutria um certo receio de déja vu. A atriz e os dois atores permanecem estáticos em quadrados iluminados por baixo. O caráter estático não se refere apenas ao corpo em contraponto com o rosto, mas também a este, mutável apenas (e repentinamente) por expressões fugazes. Os olhares permanecem fixos. O texto segue a ordem 1, 2, 3 (segundo o Alvim, emissores mas não sujeitos), que eu imaginava que iria entediar. As falas são ora fugazes ora propositalmente lentas e sua relação tem muito a ver com o tempo assumido em um e outro momento. Não irei entrar no âmago da peça. Nem irei reproduzir o que a própria autora, o dramaturgo Luciano Mazza e o próprio Alvim disseram no debate posterior a ela. Direi apenas que durante ela nossa sensibilidade é jogada de um lado a outro num contínuo aparentemente sem fim sem c...