Levei tempo para
adquirir esse clássico que o próprio prefaciador não considera tão fundamental
assim. Meus motivos foram vários, mas um dos principais foi que estava há muito
desacostumado de ler em versos, algo a que só o Fausto do Goethe, lido antes de
dormir, voltou a me reaproximar. Hoje até volto a ler Camões. Mas em termos de
teatro só Shakespeare exige tamanha atenção - algo de que sinto falta nos
textos atuais, cuja ênfase autoexplicativa cansa por facilidade aqueles que só
querem se cansar pelas dificuldades.
Kott, o polonês
descoberto por Peter Brook, faz algo que eu já havia feito em trabalho
acadêmico - no caso, envolvendo o tão amado Maquiavel e até mesmo Rousseau -,
que é acompanhar a "leitura" do bardo, por meio de uma viagem pela
sua obra, enquanto destaca aspectos que lhe interessam visando provar uma tese
(no meu caso, o método era outro). Seria uma chatice como a de quase qualquer
trabalho acadêmico se nessa viagem Kott não nos revelasse meandros nas linhas
do texto que de outra forma muito provavelmente passariam desapercebidos. É uma
alegria tremenda admitir certa passagem para depois, consultando o original do
bardo, conferirmos uma riqueza ainda maior que passava sem nos tocarmos. No
caso, senti isso bem no começo do livro do polonês, quando ele se refere à não
tão conhecida Ricardo II. Mas com o passar das linhas fui me apercebendo de
mais e mais passagens interessantes - algumas, aliás, levando em outras
direções que não as citadas por Kott.
Ler Harold Bloom, com
seu A invenção do cânone ocidental, é outra coisa bem diversa. Bloom dá tudo
mastigadinho, tal qual um Wilson ou um Berlin, e isso se por um lado atrai pela
simplicidade por outro como que nos subestima, subestima nossa intenção de
tentar ir além, de tentarmos, embora engatinhemos, até mesmo corrermos um pouco
- para amassarmos nosso nariz lá na frente (tal qual uma criança aprendendo a
andar). É decepcionante, para quem não tem tempo e tem muita vontade de voar,
sentir que o nosso guia, muito calmamente, nos mostra paisagens que não nos
dizem nada ou quase nada por desconfiarmos que não nos irão no futuro mesmo nos
relevar mesmo mais nada. Já ler Kott é interessante. Desafiador, até, para quem
mal navega em mares que, se estivesse em outras paragens, já teriam há muito
sido reveladas.
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