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enigma

é terrível viver movido a adrenalina. é como se a vida, simplesmente bem vivida, não fosse suficiente. a gente se coloca mais e mais à margem da normalidade a ponto de estranharmos quando as coisas surgem sem fricção, sem atrito.
aprontar-se para uma apresentação, naquilo que envolve gente e personalidades as mais diversas, é algo complexo. ainda mais quando o heat cruza a esquina, correndo atrás de nós, que fugimos como desesperados de contas no negativo e de fracassos no ensaio e no palco. sofre-se muito, mas ganha-se muito mais. problema é não conseguir coadunar horários. ainda mais quando surgem outros problemas de ordem mais prosaica, em nossas residências, que é aquilo a que me refiro.
dormir bem não é apenas uma necessidade, nesses casos. é fundamental. nossos corpos são que estão em evidência, nossos reflexos, nosso élan ou nosso tônus.
caio fora pensando em como melhorar ou emburacar o que já existe. que já existe por si. mas que precisa de algo mais para ampliar os horizontes rumo a percepções nunca inteiramente controladas.
o teatro é um enigma.

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