Pular para o conteúdo principal

Onde vc estava? ou Fugindo (minipeça em dois microatos), de Rodrigo Contrera

Direção Brunno Almeida. Com Rafael Fabrício e Renata Becker
Numa platéia composta por um casal de homens se beijando sem parar, três ou quatro rapazes dormitando, um ou dois amigos dos atores, a esposa do autor e alguns perdidos em manhã nem tão suja mas incrivelmente vazia, Onde vc estava? ou Fugindo, de Rodrigo Contrera, apresentado no Dramamix às 6h da manhã de sexta, elencou as fixações do autor (no personagem do mesmo nome) relacionadas a mortes trágicas ou eventos políticos recentes. Caracterizado (por Rafael Fabrício) como um boxeador em preparo para uma luta imaginária
(contra o mundo?), Contrera dialoga com um periquito inquisidor e zombeteiro, repete num gravador pequenas frases (para ele, referências) de seu guru, Gerald Thomas, numa clara referência irônica a várias peças de Beckett, para no final (sob forma de monólogo) destilar um comovente chamado aos seres pensantes que ainda se comovem e libertar o periquito, que foge mas não consegue sair da gaiola formada peas luzes de um ringue imaginário. É nesse momento que o periquito destila Fugindo, texto denso de enorme empatia, que destrói as ilusões do encontro de um fim para qualquer fuga e da criação de um perfil para qualquer ser que foge. Começando e terminando com o Bolero de Ravel (trechos do fim e do começo, respectivamente), Onde vc estava? tenta (mas não consegue) trazer o espectador ao drama dos momentos citados e das escolhas do autor - para o que pesa o esquecimento do texto pelo protagonista e a destruição dos motes do texto pela atriz (Renata Becker) que representa o periquito. Pelo material bruto, a pecinha poderia ter sido melhor aproveitada. Mas a direção se perdeu num espaço que transformou em ringue mas que obrigou a esquecer a intimidade do momento.

Comentários

Laurene disse…
kkk boa essa do periquito!

Abs do Lúcio Jr

Postagens mais visitadas deste blog

Gargólios, de Gerald Thomas

Da primeira vez que assisti a Gargólios, do Gerald (Thomas), na estréia, achei que não havia entendido. Alguns problemas aconteceram durante o espetáculo (a jovem pendurada, sangrando, passou mal duas vezes, as legendas estavam fora de sincronia, etc.) e um clima estranho parecia haver tomado conta do elenco - ou pelo menos assim eu percebi. De resto, entrei mudo e saí calado. Mas eu já havia combinado assistir novamente o espetáculo, com a Franciny e a Lulu. Minha opinião era de que o Gerald, como de praxe, iria mexer no resultado. Por isso, a opinião ficaria para depois. À la Kant, suspendi meu juízo. Ontem assisti pela segunda vez ao espetáculo. E para minha surpresa muito pouco mudou. Então era isso mesmo. Lembro de que minha última imagem do palco foi ter visto o Gerald saindo orgulhoso. A Franciny disse meu nome a alguem da produção, pedindo para falar com o Gerald. Ele não iria atender, e não atendeu. Lembro-me agora de Terra em trânsito, a peça dele com a Fabi (Fabiana Guglielm...

4.48 Psicose (peça de Sarah Kane, tradução de Laerte Mello)

Há realmente algo de muito estranho e forte nesta última peça da Sarah Kane. E não é porque ela se matou em seguida, aos 28 anos. O assunto é claro desde o começo: uma depressão mortal. É como se fosse um testamento. Muitos lados da questão são expostos de forma esparsa - não sei se todos nem se isso afinal é possível -, e ao final da leitura a gente fica com um sabor amargo na boca. Dá vontade de reler, muito embora passe o desejo de decifrar. Isto torna-se secundário, aqui. Há algo que permanece, e creio que isso se deva à qualidade do que é feito e à integridade do que é dito. Pego por exemplo, já na primeira página: "corpo (...) contém uma verdade que ninguém nunca fala". É óbvio do que se trata: da extrapolação do fisiológico, de uma lógica de que por mais que se tente diagnosticar "nunca se fala". Abre-se uma porta à compreensão disso que não sabemos muito bem o que é. A força de "Lembre-se da luz e acredite na luz/ Um instante de claridade antes da ...

algo sobre wilson e kantor

difícil não se sentir provocado ao ler e refletir algo sobre o legado de bob wilson. digo ler e refletir porque nunca vi nada DELE. e aquilo que tem no youtube, embora bonitinho, deixa demais a desejar, após ter lido o livro do galizia (os processos criativos de robert wilson). o fato é que ele, assim como o kantor, deixam-me a impressão de não, nunca ter assistido a nada similar àquilo que eles há tempos já fizeram. como sentir um déja vu face um espetáculo em que nada acontece, e em que os vivos mais parecem mortos, e os mortos (bonecos) como que expressam a vida (kantor)? (se é que eu entendi bem). dele, do kantor, a gente acha algo mais convincente no youtube. mas do wilson, nada. ou muito pouco. bob wilson convenceu-me por exemplo de que não precisamos seguir a rota dos clássicos - e por clássicos me refiro a todos esses que vemos citados aqui e acolá, por gente culta ou nem tanto, como referidos à arte contemporânea. não, realmente não preciso - mas posso querer - ler sobre o fut...