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O Salão de Baile Elétrico (de Enda Walsh, direção Cristina Cavalcanti)

Não me lembrava de haver assistido a outra peça de Walsh (que é homem), mas procuro no site e realmente isso já acontecera. Foi na peça Bate-Papo, dirigida na época por Tuna Sezerdello. Tudo bem.
O clima aqui é outro. Duas velhas rememoram épocas áureas em que eram bolinadas por rock stars locais ou abusadas por homens cheirando a peixe (elas vivem numa pequena cidade pesqueira, isolada de tudo). E uma empregada, mais jovem, vai no mesmo caminho. Enquanto isso, são visitadas pelo homem do peixe, que traz o peixe para elas, e num certo momento ele é vestido a caráter e dá uma de rock star, podendo escolher a empregada para si – mas na última hora ele arrega e as deixa a ver navios. Literalmente.
A peça remete às As Três Velhas, de Jodorovski, pela situação de isolamento de seres deslocados no tempo, mas é bem mais palatável, ou politicamente correta. Nada do escatológico do chileno, por exemplo. Quando muito uma encenação de transa com o rock star. Quando muito.
Os diálogos ágeis fazem com que embarquemos rapidamente na trama, repleta de lugares-comuns e de efeitos (repetições, encenações repetidas por personagens diferentes, etc.), quase sempre limitada a lembranças e revivências de locais e tempos de outrora. Tudo parece ocorrer num tempo passado, em vários tempos passados, que todos os personagens chamam e dos quais em última instância dependem. Ao largo, a solidão, imperscrutável, a solidão do tempo que se foi e não volta mais. Tudo termina numa desolação embebida em saudosismo. Termina como começou, com nada à vista.
É um bom divertimento, mas o humor de Walsh por vezes me escapa; algo de um humor irlandês ou inglês ou escocês, quem sabe; algo de um humor que me parece sem graça, muito embora a platéia goste e às vezes delire. Walsh deve ter seus admiradores por aqui. Mas não me anima muito. Saio com a impressão de um espetáculo bem conduzido mas sem muito sabor. Opinião estritamente minha, claro. ,,,

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