O Inferno em Mim (de Mário Bortolotto, com ele, Wanessa Rudmer, Nelson Peres e Manu, direção Bortolotto)
Assisti à última peça escrita pelo Marião em companhia do Mirisola, Paulo de Tharso, o guitarrista Brum e a esposa do Batata. O Brum ficou a um canto, ao meu lado direito, bebendo alguma coisa, e, acompanhando a trama se desenrolando, dava para ouvir as risadas e outras exclamações dos presentes. Uma hora, vieram uns aplausos. Logo explico.
A trama é simples: dois motociclistas se reencontram enquanto um deles, assassino do próprio pai, comenta seu destino. O Marião faz um dos motociclistas, o Nelson o amigo assassino, a Wanessa a ex-amante do Péricles (Marião, de apelido Pluto) que tentou servir de advogada do motociclista vivido pelo Nelson e a Manu, uma garota repassando suas experiências com os rapazes.
Em linhas gerais, a peça trata da relação do homem com a liberdade, a morte e com Deus. É interessante ver como o tema passa de mão em mão enquanto os personagens questionam uns aos outros. Tenho muita dificuldade em digerir as referências elencadas pelo Mário, por isso acabei entendendo bem pouca coisa. Ou nem tão pouco, mas menos do que gostaria. Fica o desejo de ver de novo ou de ler a peça, afinal. Talvez eu a peça ao Marião. Sei há algum tempo que nas peças do Marião algumas coisas apenas aparentam ser simples, já outras são mesmo simples, às vezes até demais.
Seja como for, a peça passa tranquila como uma dose de Jack Daniel's, bebido na hora, e fica um quê nostálgico no ar. E a leveza de duas passagens fica na memória: uma em que Pluto tenta se aproximar da ex-amante abandonada vivida pela Wanessa (aqui um detalhe: a Wanessa e o Marião estão juntos na vida real, e o entrevero entre os dois é ao mesmo tempo simpático e irônico; nesta passagem, após um solo do Marião, tudo se resolve maravilhosamente e a cena dá origem a aplausos), e outra (duas, na verdade) em que o motociclista do Nelson reflete numa igreja. É comovente ver como pode ser retratada esta nossa vida vazia sem Deus. E como é também possível vivê-la sem com isso passar pelo inferno. Ou por outro lado passando, no caso do protagonista.
Um detalhe que me ocorreu agora. É interessante ver como em todas as peças do Marião a que eu já assisti fica sempre a impressão de ele, o autor, estar nos colocando contra a parede, "obrigando-nos" a posicionarmos face estilos de vida ou simplesmente vidas que passam à nossa frente e que podem nos obrigar a afastá-las de nós, sem que nos apercebamos de nossa hipocrisia, ou que por outro lado mostram a que vieram na exata medida em que nos desafiam.
Termino dizendo que algo aprendi também após dividir com amigos uma Jack Daniel's no meu último aniversário. Ao se dividir entende-se melhor o que significa compartilhar algo de nossas vidas com amigos ou com pessoas que apesar de estarem de passagem deixam algo em nós e levam algo nosso consigo.
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