Rodrigo Contrera
Sou ator há 1 ano e 4 meses, se não me engano. Entrei na
área convidado por um diretor amigo meu. Ele viu um personagem que tinha a
minha cara e não vacilou. Nem eu, que entrei no jogo e fiz minha parte. Teve
muita coisa aprendida e bastante a fazer. Em teatro, nenhum papel acaba quando
termina a temporada.
Eu já mexia com teatro há 6 anos. Assistira ensaios em
coxias, assistira peças muito diversificadas em lugares os mais diversos,
escrevera em blogs meus a respeito, lera muito sobre teoria, prática e
principalmente história, fizera pequenas peças para apresentação em festivais,
montara uma grande, e fizera muitos amigos em diversas companhias. Montei
inclusive um grupo próprio, cujas duplas se apresentam em bares.
Depois do meu primeiro papel, fiz mais 7, todos pequenos em
peças do mesmo grupo daquele diretor. Aprendi bastante, mas sei que em atuação
– e direção – o aprendizado, além de constante, leva vidas. Daí que resolvi
tentar aprender atuando em curtas e tudo o que vier a aparecer. Fiz muitas
audições, com gente a mais variada. Até me submeti a atuar sem pagamento (algo
de que não me convenço, ainda). Mas preciso aprender. Claro, não vivo só disso
– sou jornalista, tradutor e uma penca de outras coisas (embora sempre
freelance).
Fui a audições de curtas de alunos de faculdades diversas.
Em algumas dessas audições, eu fui bem tratado. Em outras, não. Em uma em
especial, o sujeitinho que me atendeu simplesmente não colocou meu nome para o
teste – e nem deu satisfação. Em outra, uma garota do grupo nem me avisou do
resultado (apesar de eu pedir). Depois pediu desculpas e sendo admoestada por
mim (o mínimo que eu podia fazer), achou que estava tudo bem. Passei a recusar
fazer testes para alunos dessa universidade (quem quiser me pergunte qual).
Recentemente, uns caras resolveram fazer um longa e fizeram
testes com atores. Fui e passei – pela primeira vez. Marcaram um encontro
bastante longe – e eu fui. Eles não apareceram e, avisados, simplesmente disseram,
meio brincando, “que pena”. Perguntei o que era isso, pediram desculpas, e só.
Decidi não aparecer mais. A quem quiser, dou nomes e tudo o mais (inclusive os
diálogos trocados). Um relacionamento que começa a base de desculpas que não
convencem não tem como ter futuro.
Não me restrinjo ao grupo que me convidou para atuar até
agora nem ao meu próprio grupo. Ao contrário, além de ter feito oficinas com
outros grupos antes do grupo atual, hoje faço oficinas com grupos em municípios
ao redor de São Paulo e tento entrar em outros grupos, em diversos outros
locais, sempre com o intuito de aprender pela via mais difícil, que é a
prática. Teoricamente, ainda leio muito, e não deixo a dever a quase ninguém.
Mas venho aprendendo também que há grupos e grupos, e que às
vezes é necessário distingui-los antes mesmo de deles participar, seja como
membro ou como visitantes. Essa experiência com grupos de alunos e equipes de
um longa que ao que parece não cumprem pressupostos básicos de civilidade ética
acendeu-me à necessidade de educação e ética pelos membros de quaisquer grupos
e à necessidade de, enquanto ator, diretor e dramaturgo, saber recusar qualquer
contato com eles.
Pois todos nós sabemos que em muitos ambientes do teatro é
preciso conviver com práticas em outros mercados seriam inaceitáveis. Fala-se
sobre determinado e diretor e “descobre-se” que ele sempre confunde aspectos
pessoais com profissionais, tal qual o Ray Charles fazia em sua banda no começo
(e não só no começo) de sua carreira. Ou seja, “você entra se eu entrar”. Eu
sei que a vida é feita por seres humanos, e que estes são falhos e cedem a
tentações. Mas uma coisa é saber disso e outra é aceitar que isso vire regra –
porque implantada por critérios de poder. É incômodo, isso, e além do mais
desmerece qualquer pressuposto ético e profissional sério.
Isso envolve outras companhias, em que os diretores às vezes
são homossexuais mas nem por isso deixam de confundir os âmbitos. Fala-se de
outro diretor e sabemos que “ah, mas ele sempre dá em cima de todos os seus
atores, os mais bonitinhos, de preferência”. Tudo bem, o que eu tenho contra
isso? Nada, na prática, pois cada um faz o que quer fazer. Mas não é sério
lidar com a arte dessa forma. De tudo isso então percebo que antes de mais
nada, para certos ambientes, é necessário saber o que deve e o que não deve ser
feito, tanto para resguardar as pessoas quanto a própria arte.
Pois é mentira que em alguns ambientes que eu conheço
necessariamente a putaria role solta. Há quem, claro, queira isso, mas o fato é
que, desmerecendo suas imagens boêmias, determinados diretores não fazem uso de
artimanhas que lhes permite confundir os âmbitos pessoais com os profissionais
para conseguir vantagens indevidas. Ao contrário, todos sabem que esses
diretores são, digamos, “comedores”, mas não vige essa regra nem em seu grupo
nem nos ambientes que o circundam. E por que, isso? Porque é preciso manter as
aparências? Nem sempre. É assim porque não convém, porque trabalhamos num
mercado que precisa ter uma ética, qualquer uma. Pois conheço amigos que, pelo
que amigas me disseram, lhes disseram que poderiam dar-lhes papéis em peças
deles mesmos se elas fossem para a cama com eles. É triste.
Minha pequena experiência me diz, contudo, que não é fácil
convencer esses profissionais rasteiros de que eles estão errados em suas
posturas antiprofissionais. Pois virou mania achar que o mercado é assim mesmo,
que para conseguir algumas coisas é preciso mesmo pagar certos pedágios bem incômodos
para alguns e algumas. Minha posição é que pensar assim é nivelar a arte por
baixo, e contribuir para que digam que os artistas são todos uns promíscuos e
sem caráter. O fato é que isso não é verdade, mas atitudes como as que citei
fazem crer que isso o seja. Pena.
Sei, vão me chamar de ingênuo ou até de coisas piores.
Dane-se. Eu continuo homem, tenho minhas fraquezas e minha vida toda
particular, mas não aceito rebaixar a arte pela fraqueza de uns e de outros. É
uma bosta dizer isso, de tão claro e óbvio que é, mas é a vida.
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