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Um branco

Não desejo a ninguém que esqueça sua fala no meio ou começo de uma peça.
Mas foi isso que aconteceu ontem comigo. Eu mal entrara na cena e de repente travei.
Digo-lhes que a sensação é HORRÍVEL. Dá para sentir FISICAMENTE o tempo se fechando. Não, não me refiro a nuvens. Refiro-me que, a cada segundo, a cena torna-se mais opressiva, e nós, que estamos no redemoinho, não podemos recuar. Só existe andar para a frente. Toda cena é PARA A FRENTE. Não existe a possibilidade de recuo, de forward, de rewind, não existe mesmo. E TUDO ESTÁ EM NOSSAS MÃOS.
A solução foi ir direto ao ponto em que minha partner, a ótima Majeca, pega o touro pela unha. Eu já havia feito isso em outro momento de esquecimento, e daquela vez a Helena Cerello foi quem pegou o touro.
A desolação que a gente sente depois que a cena termina e somos obrigados a nos defrontar conosco é indescritível. Entendo claramente por que determinados atores ou atrizes, cobrados por seus diretores, que os formataram, ficam quase traumatizados com a sensação. É foda. Muito pior do que imaginam.

Ainda bem, contudo, que conseguimos, a Majeca e eu, conduzir a cena como deveria a partir de então - na verdade, até experimentamos saídas que antes não haviam sido tomadas. Foi interessante. E o pessoal gostou. Mas o sofrimento, VOCÊS NEM IMAGINAM COMO É.

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29/7 (a partir de 28) - Teatro e artes

Ontem, ao ouvir o Gerald, quanto a como coloca a musica (depois), e depois ainda, ao ver uma musica passando pela partitura (e me deixando uma impressao de impossibilidade de traducao em algo mais), percebi que a arte finalmente havia voltado a assumir um lugar inextrincavel em mim. Finalmente percebi novamente que ela existia em mim para algo alem da minha vida, e percebi tambem que qualquer motivacao extemporanea (tipo celebridade, valor em si, razao) para ela era, alem de inutil, irrelevante. Percebi isso e na hora me libertei de coisas ao meu redor imensas, que me faziam sentir amargurado por um peso muito grande. Como se eu DEVESSE atribuir algo aa minha vida por me sentir pequeno demais para tudo o que investi nela. Isso fez com que eu tambem entendesse que, quando QUALQUER COISA for bem feita, ja EE arte em si, e por isso mesmo entendi o valor da edicao no cinema, da atuacao, da luz e tudo mais. Tudo adquiriu de repente um valor maior, para alem da vida inclusive.

(Em) Branco (de Patricia Kamis, dir. Roberto Alvim, Club Noir, 3as a 5as durante o mês de agosto)

Fui à estreia da segunda peça da leva de oito novos selecionados que o Alvim vai encenar municiado de sua leitura na noite anterior. Esperava ver algo relativamente tradicional e nutria um certo receio de déja vu. A atriz e os dois atores permanecem estáticos em quadrados iluminados por baixo. O caráter estático não se refere apenas ao corpo em contraponto com o rosto, mas também a este, mutável apenas (e repentinamente) por expressões fugazes. Os olhares permanecem fixos. O texto segue a ordem 1, 2, 3 (segundo o Alvim, emissores mas não sujeitos), que eu imaginava que iria entediar. As falas são ora fugazes ora propositalmente lentas e sua relação tem muito a ver com o tempo assumido em um e outro momento. Não irei entrar no âmago da peça. Nem irei reproduzir o que a própria autora, o dramaturgo Luciano Mazza e o próprio Alvim disseram no debate posterior a ela. Direi apenas que durante ela nossa sensibilidade é jogada de um lado a outro num contínuo aparentemente sem fim sem c