Pular para o conteúdo principal

"Temporada de Caça", peça de Sérgio Mello, em Coleção Primeiras Obras

Comprei o livro do próprio Sérgio em outubro do ano passado curioso com sua produção.
Levei todo esse tempo para ler a primeira peça do livrinho.
Temporada de Caça mantém o título enigmático até o finzinho.
Tudo ocorre numa sociedade que desde o começo aparece como o fim do mundo da ignorância.
Eva e Elisa, mãe e filha, conversam sobre como pode ocorrer a vida de ambas após o acidente que vitimou a segunda e que a deixou manca, ela com mais de XX anos (mantenho o XX para não tirar a graça da história), e a morte do irmão, Mauro, chacinado por ser da torcida rival de uma galera que invade o ônibus em que ele e seu amigo, Rosemiro, estavam.
Bom, isso resume boa parte da trama. Mas não tira a graça de nada.
A trama é realista, isso fica claro já de cara. Mas o tratamento que o Sérgio dá às reviravoltas da peça fazem-nos crer, por pouco, muito pouco, que estamos numa espécie de teatro do absurdo. Tudo é solucionado só ao fim, ao finzinho mesmo da peça. Tudo fica claro, inclusive o título, e recaímos na mesma impressão do começo, de estarmos no fim do mundo da ignorância, em uma sociedade que mal se sustenta nos próprios pés. Um sabor de sola gasta parece dominar então o ambiente, e não nos enganamos. Tudo termina como começa. E nisso não tiro qualquer graça a nada. A graça está justamente no entretanto.
Ao contrário de outros autores, que abusam das rubricas, dizendo como cada personagem precisa se comportar, aqui o próprio texto é quem dita as normas. Sobra assim muito para o ator, sobra muito para ele criar. Isso não significa que haja realmente ambiguidade nas falas ou nos atos dos personagens. Significa, isso sim, que a peça cairá mais pesadamente no estômago de quem assistir a depender da direção.
Sérgio é então bastante generoso nessa primeira peça. E ainda tem as outras.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Gargólios, de Gerald Thomas

Da primeira vez que assisti a Gargólios, do Gerald (Thomas), na estréia, achei que não havia entendido. Alguns problemas aconteceram durante o espetáculo (a jovem pendurada, sangrando, passou mal duas vezes, as legendas estavam fora de sincronia, etc.) e um clima estranho parecia haver tomado conta do elenco - ou pelo menos assim eu percebi. De resto, entrei mudo e saí calado. Mas eu já havia combinado assistir novamente o espetáculo, com a Franciny e a Lulu. Minha opinião era de que o Gerald, como de praxe, iria mexer no resultado. Por isso, a opinião ficaria para depois. À la Kant, suspendi meu juízo. Ontem assisti pela segunda vez ao espetáculo. E para minha surpresa muito pouco mudou. Então era isso mesmo. Lembro de que minha última imagem do palco foi ter visto o Gerald saindo orgulhoso. A Franciny disse meu nome a alguem da produção, pedindo para falar com o Gerald. Ele não iria atender, e não atendeu. Lembro-me agora de Terra em trânsito, a peça dele com a Fabi (Fabiana Guglielm

(Em) Branco (de Patricia Kamis, dir. Roberto Alvim, Club Noir, 3as a 5as durante o mês de agosto)

Fui à estreia da segunda peça da leva de oito novos selecionados que o Alvim vai encenar municiado de sua leitura na noite anterior. Esperava ver algo relativamente tradicional e nutria um certo receio de déja vu. A atriz e os dois atores permanecem estáticos em quadrados iluminados por baixo. O caráter estático não se refere apenas ao corpo em contraponto com o rosto, mas também a este, mutável apenas (e repentinamente) por expressões fugazes. Os olhares permanecem fixos. O texto segue a ordem 1, 2, 3 (segundo o Alvim, emissores mas não sujeitos), que eu imaginava que iria entediar. As falas são ora fugazes ora propositalmente lentas e sua relação tem muito a ver com o tempo assumido em um e outro momento. Não irei entrar no âmago da peça. Nem irei reproduzir o que a própria autora, o dramaturgo Luciano Mazza e o próprio Alvim disseram no debate posterior a ela. Direi apenas que durante ela nossa sensibilidade é jogada de um lado a outro num contínuo aparentemente sem fim sem c